Enquanto é verdade que no Novo Testamento os servos do Senhor são designados “soldados”, e enquanto é também verdade que existem batalhas a serem lutadas, existe uma grande batalha fundamental e toda inclusiva na qual o povo do Senhor não têm parte alguma.

sparksSe envolver nela é escrever sobre a obra de nosso Senhor Jesus na Sua Cruz, Fracasso! – descrevê-la como algo que não é válido. Existe uma batalha na qual você e eu não temos nada a lutar. Foi a batalha do Senhor, não a nossa, e a maioria dos problemas que surgem na experiência de multidões do povo do Senhor são sobre o reconhecimento e estabelecimento desse fato. Houve uma batalha que inclui todas as outras batalhas, a qual foi lutada pelo próprio Senhor por nós. É importante para nós sabermos ambos os fatos, e qual foi essa batalha.

“Então veio o Espírito do Senhor, no meio da congregação, sobre Jaaziel, filho de Zacarias, filho de Benaia, filho de Jeiel, filho de Matanias, levita, dos filhos de Asafe, E disse: Dai ouvidos todo o Judá, e vós, moradores de Jerusalém, e tu, ó rei Jeosafá; assim o Senhor vos diz: Não temais, nem vos assusteis por causa desta grande multidão; pois a peleja não é vossa, mas de Deus. Amanhã descereis contra eles; eis que sobem pela ladeira de Ziz, e os achareis no fim do vale, diante do deserto de Jeruel. Nesta batalha não tereis que pelejar; postai-vos, ficai parados, e vede a salvação do Senhor para convosco, ó Judá e Jerusalém. Não temais, nem vos assusteis; amanhã saí-lhes ao encontro, porque o Senhor será convosco” (2 Cr. 20:14-17).

“E, despojando os principados e potestades, os expôs publicamente e deles triunfou em si mesmo (na Cruz)” (Col. 2:15).

Uma Vitória A Ser Apropriada pela Fé que Louva

A história que lemos no Velho Testamento é uma ilustração disso. Não estou dizendo que encaixa com Col. 2:15 em doutrina, mas sim em princípio. O princípio é este – que em ambas as passagens da Escritura uma batalha é estabelecida como tendo sido já vencida.

A seguinte coisa é que tem de se entrar pela fé na vitória que já existe. Tem de haver uma posição assumida em relação a isso, e não lutar para isso. Se você começar a assumir essa luta você será destinado à derrota, porque você afastou o terreno de Deus de debaixo dos seus pés. Veremos isso quando cheguemos à natureza da batalha. Mas é muito sério, e devemos reconhecê-lo. Aqui há algo em existência, e sobre isso, como um fato realizado na esfera das hostilidades, uma posição tem de ser tomada pela fé e não permitir nenhum conflito.

No caso do povo de Judá, dos quais lemos da fé deles quanto ao que fora dito – “A batalha não é vossa, mas de Deus… nesta batalha não tereis que pelejar” – foi demostrado em cântico. Você não precisa que fique para mostrar quão necessária a fé era, e que era fé genuína e não mero otimismo. Não, era de fé que se precisava. Era uma situação muito desesperante naturalmente, mas a fé foi demostrada, e foi demostrada ao cantar. O cântico deles foi a evidência de que eles acreditavam em Deus e na Sua Palavra; eles creram no assunto que fora declarado para eles, e o provaram ao cantarem. E não foi o tipo de cântico do pequeno menino andando num caminho rural no escuro, que canta para tentar se manter alegre no meio de medos terríveis. Não existe duvida quanto a isso, foi um cântico de segurança e confiança.

“…Jeosafá pôs-se em pé, e disse: Ouvi-me, ó Judá, e vós, moradores de Jerusalém: Crede no Senhor vosso Deus, e estareis seguros; crede nos seus profetas, e prosperareis; E aconselhou-se com o povo, e ordenou cantores para o Senhor, que louvassem à Majestade santa, saindo diante dos armados, e dizendo: Louvai ao Senhor porque a sua benignidade dura para sempre. E, quando começaram a cantar e a dar louvores, o Senhor pôs emboscadas contra os filhos de Amom e de Moabe e os das montanhas de Seir, que vieram contra Judá, e foram desbaratados” (2 Cr. 20:20-22).

A Batalha Já vencida na Cruz

E então – é aqui onde começamos a ficar mais perto do cerne da natureza desta batalha – o cântico foi governado pelo lado sacerdotal e levítico. Você verá no final do capítulo anterior como o governo foi entregue nas mãos dos sacerdotes; e depois a narrativa no capítulo 20 mostra que eram os Levitas, os quais eram para louvar, começaram espontaneamente a louvar (v19). Louvor que expressa fé era governado pelo que era sacerdotal e levítico – o qual mostra a natureza da batalha de uma vez. Esta era a questão, toda a questão – de que lado estava Deus? E Deus não têm favoritos. Deus não está de um lado só porque Ele se sente inclinado a favorecer esse lado. Deus está somente do lado da justiça, do lado da santidade – “na beleza da Sua santidade”. Deus está do lado em que a salvação já é implícita em virtude do governo sacerdotal, ou o governo dos princípios sacerdotais – isto é, o Sangue, a Cruz, tudo que a redenção significa através da obra do Senhor Jesus. E portanto, a resposta à pergunta, de que lado está Deus? É esta – Ele é achado onde isso é representado e implícito, o qual é a obra do Seu Filho no Calvário. Essa é a natureza da batalha; e essa não é nem a sua nem a minha batalha; essa foi a batalha de Deus!

De maneira que chegamos a esta passagem bem conhecida na Carta aos Colossenses. É uma passagem maravilhosa. Tenho ficado olhando várias versões diferentes, e, embora eu quase não costumo incomodar você com a técnica de traduções diferentes, acho que vale a pena gastar tempo em duas ou três.

“Tendo despojado os principados e potestades, Ele os expôs publicamente, trunfando deles (na Sua cruz)”.

“Ele roubou os domínios e potestades da sua presa, fez deles um espetáculo público, triunfando deles (na Sua cruz)”.

“Ele desarmou os principados e potestades e os exibiu publicamente, triunfando deles na Sua cruz”.

Ora, você observa que está tudo no passado; que é algo realizado. A base do inimigo lhe foi retirada – essa é a primeira coisa; e quando a base de um inimigo é retirada dele, ele fica em confusão total. Observe a confusão lá em 2 Cr. 20 – eles se estão matando entre si. Por quê? – O terreno deles em que confiavam lhes foi retirado. Em Colossenses é a mesma confusão: “os envergonhou”. O que é envergonhar senão confusão? Se alguém está em confusão eles ficam praticamente envergonhados. Em confusão ficam impotentes, você pode tirar a presa deles; e isso é o que Judá fez na história que lemos. É por isso que lhe dei aquelas diferentes versões. Ele tirou a presa deles, presa dos principados e potestades. Por quê? Porque a base deles foi retirada.

O Único Terreno de Esperança do Inimigo

Sobre qual base os principados e potestades tinham confiado, e sobre qual base acharam a força? Agora, acompanhe atentamente aqui; Vamos olhar para isso.

“e havendo riscado o escrito de dívida que havia contra nós nas suas ordenanças, o qual nos era contrário, removeu-o do meio de nós, cravando-o na cruz; e, tendo despojado os principados e potestades, os exibiu publicamente e deles triunfou na mesma cruz. Ninguém, pois, vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa de dias de festa, ou de lua nova, ou de sábados, que são sombras das coisas vindouras”.

Você compreende o motivo – escrito em ordenanças e demandas legais. “Farás!” “Não farás!” – a totalidade da lei escrita em ordenanças contra nós. Onde estava e está a força, a solidez dos principados e potestades? Está aqui – primeiramente, em todo esse conjunto de demandas legais; e, depois, na fraqueza do homem. Todo o poder de Satanás é mantido nessas duas coisas contra nós – “Farás!” “Não posso!”; “Não farás!” “Mas sempre o estou fazendo, não posso evitá-lo!” A demanda, a lei; e a nossa fraqueza. Ó, que divertimento é para o diabo! Toda a sua força está lá, toda a sua confiança está lá, toda a sua solidez está lá. Retire essa base, retire o escrito em ordenanças contra nós, retire dele todas as demandas legais, e ele fica sem nada para se apoiar, ele fica em confusão; é feito dele um espetáculo público, é envergonhado, fica em confusão; ele é destroçado, ele é desamparado.

Você permanece, e logo você toma. Ouçam amigos – logo que você, como um crente em Jesus Cristo admitir a menor sugestão no seu coração ou mente de que há um questionamento acerca da sua salvação você terá se rendido ao diabo e desfeito a obra de Jesus Cristo na Sua Cruz; você terá reforçado o poder do diabo para lhe arruinar, logo que você admitir qualquer coisa como essa. Satanás deve recuperar terreno a fim de ter poder, e seu terreno é esse. Qual é? – a nossa fraqueza contra as demandas legais; esse é o terreno dele, e ele nunca, nunca, até o último suspiro de nossos corpos, parará de tentar obter esse terreno de volta nas suas mãos.

As Sugestões do Inimigo Para Serem Repudiadas

Mas ouça novamente. Você e eu não devemos lutar essa batalha. Essa é a questão – não é para lutar essa batalha. É para nós tomarmos a atitude de que a batalha já foi lutada e terminada – isso é tudo. Deixe a sugestão da dúvida ser apresentada – a nossa atitude deve ser que não existe espaço para uma sugestão como essa; não é da nossa conta em absoluto; Deus assumiu isso, Deus em Cristo assumiu a responsabilidade disso e o resolveu de uma vez para sempre! Admita a sugestão, e veja a bagunça que o diabo fará da sua vida! Você sabe, tanto como eu, que o cântico saiu imediatamente. O que então é para nós fazermos nesse assunto? Temos de permanecer em fé e nos regozijar – isso é tudo. Ó, se alguma vez um cristão, ou mesmo um servo de Deus com longa experiência diz qualquer coisa a você indicando que ele ou ela tem algum questionamento, alguma dúvida sobre a sua salvação, você diz logo, “você tem devolvido o terreno absolutamente ao diabo e ele está roubando você da sua vida”. Não consigo ser o suficientemente forte quanto a isto. Conheço o inimigo neste assunto, e o que ele está tentando fazer, e muitas pessoas estão se voltando através dele para si mesmas e sendo obrigadas a girar sobre todo este assunto de se Deus está com eles, e questionar a própria salvação deles. Eles estão sempre levantando de novo esta questão básica do pecado, o olhando, falando disso. A consciência deles parece estar obcecada com este assunto do pecado.

Se há uma coisa específica que surgiu como base de controvérsia entre o Senhor e você mesmo, e você o sabe, a sua atitude para com isso deve ser a de retornar para esta base fundamental e inclusiva e colocá-lo lá, e não pôr em questão todo este assunto do imenso triunfo do Calvário. “Se confessarmos os nossos pecados” – não uns aos outros; não vai por aí confessando os seus pecados às pessoas – “Se confessarmos os nossos pecados” – a Ele – “Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda injustiça” (1 João 1:9). Por quê? Porque Ele já obteve o terreno completo para assim fazer.

Confiança, Essencial Para a Vitória

Mas lembre-se, não existe nenhuma contradição aqui. ” Nesta batalha não tereis que pelejar; postai-vos, ficai parados, e vede a salvação do Senhor para convosco”; “amanhã saí-lhes ao encontro”. Lhe parece isso uma contradição? Ó não, não há contradição. Você deve expressar a sua fé. Sim, há luta para ser fazer, mas existe uma grande diferença entre lutar numa vitória e lutar para uma vitória quando se trata da nossa salvação. Ó, por favor, queridos amigos, não esteja entre aqueles que falam muito sobre o diabo e a vitória do Senhor sobre ele, e tem em seus próprios corações uma sombra negra neste assunto. As únicas pessoas que ousam encarar o inimigo e tomam uma atitude contra os poderes malignos sãos as pessoas que têm tanta segurança nos seus corações neste assunto fundamental que eles ficam em alegria. Não vai contra o inimigo com uma nuvem de dúvida no seu coração. Este inimigo não pode ser encarado com uma dúvida. Temos de assumir uma posição celestial, uma posição num fato estabelecido. Logo que você descer para a posição da natureza – o que nós encontramos aqui na terra e em nós mesmos – seremos anulados.

Para manter a nossa posição celestial temos de reconhecer que toda a questão da santificação progressiva é uma outra questão inteiramente diferente, e não existe esperança para nós – não faremos progresso na santificação e conformidade à imagem de Cristo – a menos que esta questão fundamental seja inclusivamente toda resolvida. Devemos ter um terreno de vantagem da qual nos mover, devemos ter uma posição na qual permanecemos e permanecermos completamente seguros em toda a vontade de Deus.

Introspecção Leva à Derrota

Ora, com mais uma palavra encerrarei. Queridos amigos, se alguma verdade tem o efeito de voltar você para si mesmo, tornando você introspectivo, ocupado consigo mesmo numa maneira espiritual, essa verdade foi compreendida de maneira errada. Você pode assumir a posição do mais espiritual, mas você está tudo errado na sua compreensão. Esta grande obra que Cristo fez na Sua Cruz nunca pretendeu tornar ninguém miserável. É claro, não é necessário dizer; contudo existem multidões que ficam miseráveis após terem confiado no Senhor, miseráveis sobre a questão do pecado nas suas vidas; e o número, temo, está aumentando. Sempre mantenha uma linha muito distinta e ampla entre revelação mais completa, verdade mais profunda (seja como você o denomine – toda essa esfera de avanço para o pleno crescimento das coisas) e todo este assunto da introspecção. Algumas pessoas parecem pensar que para se tornar mais espiritual devemos nos tornar mais intensos, e amarrados, e ocupados com toda esta questão da vida espiritual, e realmente eles são as pessoas mais insuportáveis, a alegria desapareceu delas. Tenho certeza disto, que nada virá até você, por mais profundo, por mais poderoso, por mais tremendo, pela revelação do Espírito Santo, que torne você miserável. A revelação de Jesus Cristo pelo Espírito Santo – e não existe outra revelação – nunca tornará uma alma miserável. Há algo de errado num cristão ser miserável em assuntos espirituais, e ou é uma falha em compreender a única grande realidade absoluta, que a vitória foi de Deus e que Ele ganhou em Cristo, completamente e definitivamente, e não somos chamados para participar de modo algum nessa batalha; ou a verdade que veio posteriormente foi mal entendida e tem se tornado um fardo penoso a suportar. O Senhor Jesus disse, “Meu jugo é suave e Meu fardo é leve” (Mat. 11:30).

E qual era o jugo? Bem, ouça novamente; você vai achá-lo em vários lugares no Novo Testamento onde a própria palavra é usada. “Eles atam fardos pesados e difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos homens, mas eles mesmos nem com o dedo querem movê-los” (Mat. 23:4). Qual era o jugo, o fardo? – a lei, ordenanças, “farás”, “não farás”; a imposição disto. “Meu jugo é suave e Meu fardo é leve”. Ele “despojou os principados e potestades, Ele fez deles um espetáculo público, triunfando deles na (Sua Cruz)”. Como? Ele cravou na Sua Cruz toda a lista de ordenanças contra nós e tomou o terreno da força do inimigo e a segurança dele. Você sabe muito bem que o inimigo não tem nenhum poder abstrato sobre ninguém. É sempre concreto, é sempre positivo. O diabo deve ter algo para fazer sentir o seu poder. Não existe, na realidade, a menos que ele obtenha terreno moral, e a coisa com a que ele açoita e impele e assedia é esta lei de ordenanças carnais que estavam contra nós. contra nós, contra nós!

Ouça! O inimigo está sempre dizendo que Deus está contra você, que a Sua Palavra está contra você, coisas estão contra você. Esse é o seu terreno e força. Mas – “Se Deus é por nós… (Rom. 8:31). Ó, isso é outro lado – “por nós!” Como? Não de maneira abstrata. “Ele despojou”, “Ele fez um espetáculo”, “Ele triunfou”. Não só foi um confronto entre forças espirituais na esfera invisível; uma questão moral estava envolvida. Estava ganhando terreno e roubando os inimigos da força deles, da coesão deles. Resultou em confusão. Eles na realidade, dizem, ‘O que podemos fazer agora? Todas as nossas armas se foram’. Depois eles começaram a se culpar entre eles, se matar entre eles. Não existe amor entre estas forças malignas, eles não tem coesão de amor. É tudo ódio lá, e logo que eles acham o terreno retirado deles, eles se voltam um contra o outro.

Bem, pararemos aí; mas tenha este assunto resolvido. Qualquer cristão introspectivo é inútil como servo do Senhor. Os seus dias, semanas, meses, anos, se vão, e tudo que poderia ser para o Senhor é devorado pelos gafanhotos da incerteza quanto à sua própria vida espiritual. A vida é jogada fora, o diabo é triunfante, ele está estragando tudo. Se você quer conhecer a eficácia, então não lute nessa batalha de modo algum. O verdadeiro poder que vence neste assunto é a fé. Então creia em Deus, e, se quiseres, creia nos Seus profetas – aquilo que lhe é declarado, o qual é a própria verdade de Deus.

T. Austin-Sparks

Primeiramente publicado na revista “Uma Testemunha e Um Testemunho” Jul-Ago 1948, Vol 26-4.

Origem: The Battle Which Is Not Yours”

A Batalha Que Não é Sua – T. Austin-Sparks

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